Entrevista Dep. Luiza Erundina por Liderança do PSB – outubro/2015

O Congresso Nacional promulgou no dia 15 de setembro a Emenda Constitucional 90/15, que inclui o transporte como um direito social garantido pela Constituição Federal. A medida, de iniciativa da deputada Luiza Erundina (PSB-SP), passa a obrigar o Governo a desenvolver e a adotar políticas públicas específicas votadas à mobilidade.

PSB na Câmara conversou com a deputada Luiza Erundina sobre a PEC e o que sua aprovação representará para a sociedade.

A proposta da tarifa zero foi apresentada pela primeira vez em outubro de 2010, quando a senhora era a prefeita de São Paulo. Como se deu a concepção da ideia?

Inicialmente tentamos implantar mudanças importantes na política de transporte da cidade de São Paulo. Ao entrarmos na prefeitura, procuramos melhorar a qualidade da frota. Mudamos os contratos, municipalizando o transporte de modo que o controle do serviço e o controle da receita desse serviço ficassem sob o controle direto da prefeitura. Neste sentido, trocamos alguns termos dos contratos vigentes e passamos a remunerar por quilômetro rodado em vez de remunerar por passageiros transportados, que era a regra dos contratos anteriores ao nosso governo. Com as mudanças, os empresários tiveram interesse em aumentar sua frota, colocar mais ônibus nas ruas, porque quanto mais ônibus, mais eles rodavam e mais retorno tinham. Isso garantia ônibus com menos passageiros e melhor serviço para a população. Exigíamos que o ônibus não pudesse ter mais que um certo número de anos.

Essas mudanças foram a base para a tarifa zero?

Entendemos naquele momento que o custo do transporte como um direito não deveria recair sobre o usuário desse serviço. A prefeitura também não poderia arcar sozinha com o custo total do serviço no sentido de baratear ou de zerar [a tarifa]. Deste modo, [o transporte] deveria ser um serviço mantido pelo conjunto da cidade, pelo conjunto da sociedade, também a prefeitura entrando com uma fatia de subsídio, mas grande parte desse serviço seria socializada como um todo por meio de um percentual na alíquota do IPTU, que é um imposto municipal.

Quer dizer, segregaria na alíquota do IPTU anualmente um adicional – que não era muito grande. Era absolutamente suportável. Isso aliviaria o usuário direto. Não ficaria só ele sendo responsável pelo custo total de um serviço que é caro e que todo ano é reajustado de acordo com a inflação.

Pode-se afirmar que o Tarifa Zero foi a gênese da PEC que incluiu o transporte como direito social na Constituição Federal?

Em 2005, em Santa Catarina e no Paraná começou um movimento de estudantes, fazendo mobilização contra as tarifas de transporte coletivo. Aí nasceu o movimento que é o Passe Livre, inspirado no Tarifa Zero. Quando o Passe Livre começou a fazer a sua movimentação surgiu a ideia de apresentar uma PEC transformando o transporte coletivo em direito social

Portanto, o direito ao transporte, passa a ser obrigação do Estado. Consequentemente, os governos são obrigados a terem uma política para garantir esse direito ao cidadão. É um instrumento legal, constitucional, que te dá condições, inclusive, de você, na impossibilidade de ter recursos para se locomover na cidade, ir até o Ministério Público e conquistar a garantia do Governo ter que garantir o seu deslocamento.

A senhora acredita que o fato de o transporte ser agora um direito social contribuirá para a redução das desigualdades sociais?

Em certo sentido, sim, porque não é só essa a mobilidade que exclui as pessoas. O que exclui s pessoas é o emprego, se tem ou se não tem; é o salário, que é muito grande a distância entre os que mais ganham e os que ganham menos. É um fosso enorme o que há no Brasil em relação a outros países, mesmo países pobres do continente latino-americano. O Brasil está em desvantagem em relação aos outros em termos de acesso a certos direitos, a certas condições. Para o trabalhador, o assalariado que depende do transporte, é melhor não pagar pela locomoção ou pagar menos pelo transporte, que é reconhecido na sua Constituição como um direito básico fundamental. É o direito dele se locomover e isso é uma condição para diminuir a desigualdade. Não é para garantir a igualdade. É para diminuir a desigualdade, porque só se resolve a desigualdade com renda, salário, trabalho.