Em debate na quinta-feira (22) na Comissão de Legislação Participativa (CLP) da Câmara dos Deputados sobre a crise do País, representantes de entidades contrárias à política econômica do governo criticaram os juros altos e os cortes orçamentários feitos para pagar a dívida pública. A CLP é a comissão da Câmara encarregada de recolher sugestões da população e transformá-las em propostas legislativas.

Maria Lúcia Fattorelli, da Associação Auditoria Cidadã da Dívida, disse que 45% do Orçamento da União são destinados ao pagamento da dívida pública, que é de R$ 2,6 trilhões, segundo o Tesouro Nacional. Parte da dívida é decorrente da emissão de títulos — papéis que o governo vende com o compromisso de pagar depois, a preço mais alto. É uma forma de reforçar o caixa sem emitir moeda nem aumentar impostos. O problema é quando a conta chega e o governo tem de honrar o compromisso de comprar de volta o papel, pagando mais caro.

“O Brasil é um país que não emite moeda, mas emite dívida, com os maiores juros do mundo. E os bancos compram essa dívida, criam moeda emprestando para os seus clientes. É uma verdadeira farra para o sistema financeiro”, explicou Maria Lúcia Fattorelli, que defende uma auditoria na dívida pública brasileira.

Desestímulo
O jurista Fábio Konder Comparato também criticou essa maneira de financiar o caixa do governo. Segundo ele, os principais beneficiados por essa política são os bancos, que lucraram no primeiro semestre deste ano mais de 40% a mais que no mesmo período de 2014, sem aumentar o crédito e num período de recessão.

Para Comparato, o mercado financeiro desestimula a indústria nacional, por ser mais lucrativo do que a produção. “Em vez de aumentar impostos, por que os estados não emitem títulos da dívida pública? Para a classe rica, há duas vantagens. Em primeiro lugar, não há aumento de impostos, e algumas vezes eles até são reduzidos. Segunda vantagem extraordinária: eles, ricos, passam a ganhar juros, ou seja, vivem de renda e um número considerável de industriais se tornou rentistas.”

Economistas presentes ao encontro identificaram o principal fator que torna o mercado financeiro atrativo: os juros altos. De acordo com o economista Roberto Piscitelli, do Instituto Justiça Fiscal, os juros correspondem a R$ 480 bilhões do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB). “Não há sistema fiscal no mundo, por mais aperfeiçoado, que suporte uma carga de juros semelhante à do Brasil”, argumentou.

Efeito dos cortes
Os participantes da mesa-redonda criticaram também o fato de os cortes orçamentários não atingirem os recursos destinados ao pagamento da dívida e incidirem sobre áreas sociais, como saúde e educação.

Ramon Bentivenha, da Associação Brasileira contra a Corrupção e Impunidade, classificou como ilegal essa prioridade. “As políticas adotadas, infelizmente, não só neste governo, mas em todos, dão conta de cortes justamente nas áreas mais sensíveis, como saúde, educação e Previdência. Tirar dinheiro dos direitos sociais para o pagamento da dívida, para formação do chamado superavit, não é apenas uma imoralidade, mas uma ilegalidade”, disse.

Segundo a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), idealizadora do debate, o objetivo foi dar aos parlamentares elementos para sugerir projetos que mudem essa realidade. “Há uma expectativa da sociedade em relação a este esforço, da Câmara, para não ficarmos tão presos e focados numa conjuntura que, lamentavelmente, tem nos oprimido e nos tirado a perspectiva de uma solução para os graves problemas que o povo brasileiro vem enfrentando”.

Uma das sugestões apresentadas no encontro foi a apresentação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que proíba o Congresso de alterar os recursos orçamentários destinados ao pagamento da dívida.

Reportagem – Antonio Vital
Edição – João Pitella Junior